quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Análise crítica do livro Estive em Lisboa e lembrei de você, de Luiz Ruffato


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1) As estratégias de construção da narrativa (título, epígrafes, nota do autor e estrutura).


Título: Segundo o próprio autor, o título gramaticalmente correto deveria ser ‘Estive em Lisboa e me lembrei de você’, mas que segundo ele: “não se fala mais assim lá”. Em referência ao “mineires” de Cataguases, Minas Gerais, em que seus moradores por peculiaridade não utilizam o pronome reflexivo, nesse caso, o pronome ‘me’. O título também nos cria um imaginário sobre quando viajamos, vemos lojas de souvenires e lembramos de alguém que está longe, e que queremos presentear.

Epígrafe: Em uma obra literária, epígrafe é uma curta citação colocada em uma página no início da obra ou em destaque na abertura de um capítulo. Funciona como um resumo do que se vai ler em seguida.
No livro, Ruffato utiliza como epigrafo o poema ‘Brasil’ de Miguel Torga, português, que emigrou para o Brasil ainda criança para trabalhar e que volta à Portugal poucos anos depois com intuito de estudar. E o poema se encaixa perfeitamente à narrativa do livro, e prepara o leitor para a temática que seguirá os capítulos: imigração, saudade, desilusão, incerteza, medo e a ligação a flor da pele entre os dois países.

Nota: A nota no livro já é bem esclarecedora de como a história será contada. Através dela, Ruffato deixa claro suas intenções de transcrever ao máximo as falas de Sérgio de Souza Sampaio, personagem principal do livro. Na nota, o que segue “é o depoimento, minimamente editado [...] gravado em quatro sessões, nas tardes de sábado dos dias 9, 16, 23 e 30 de julho de 2005, nas dependências do Solar dos Galegos, localizado no alto das escadinhas da Calçada do Duque, zona história de Lisboa.” Assinada pelo autor como L.R, essa nota nos remete a realidade dos acontecimentos que virão.

Estrutura: O livro segue uma estrutura ‘moderna’, de leitura rápida, de poucas páginas e se divide em duas partes: ‘Como parei de fumar’ e ‘ Como voltei a fumar’.
A primeira, com Serginho ainda morando no Brasil, mas especificamente em Cataguases (MG). Nesse primeiro momento conhecemos o personagem a partir de acontecimentos muito específicos da vida dele sem adentrar muito em seu passado: é apresentado seu modo de vida na cidade; quando ele se casa; quando turbilhões de problemas aparecem e quando ele decide ir para Lisboa. Nessa primeira parte, é possível também ver mais forte a presença da fala mineira e suas expressões peculiares: “piriri”, “engalfinharam”, “perereco”.
Como voltei a fumar’ é a segunda parte do livro, em que Serginho já se encontra em Portugal. Nesse momento, Sergio descobre as diferenças lingüísticas e culturais de Lisboa. É nessa parte também que o drama da imigração aparece mais forte e vivo, junto com as expressões próprias daquele país: “Adeusinho”, “Chapéu-de-chuva”, “tasca” que Serginho reproduz com freqüência.


2)
Destaque traços da linguagem utilizada e comente-os.

No livro, o autor procura manter a oralidade da figura central (Serginho), que fala o “mineires”, numa tentativa de transcrever um sotaque mineiro à escrita narrativa do livro. Há uma reconstrução de memória do personagem, que torna a leitura do livro até mais envolvente e, ao mesmo tempo, até mais difícil, por seu linguajar peculiar. Esses traços o autor faz questão de preservar, deixando claro em suas entrevistas, que nem ao menos se preocupa com a dificuldade que seria traduzir o livro para outras línguas. Ruffato diz que “A memória coletiva se realiza quando essa literatura está além dela própria.”

Para ele, a importância da literatura é “passar as fronteiras dela mesma; escrever numa língua específica, num tempo específico, sobre algo específico e poder falar para todas as línguas, para todos os tempos e para todas as pessoas.”.
Se destaca também as marcas de expressões do linguajar de Sergio enquanto estava em Minas Gerais: “destrinchar”, “procê”, “um trem esquisito”, “estrebuchar”, “já ir morrendo”. E quando estava em Lisboa: “borrego”, “patrício”, “gajo”, “pa bosê”, “às papas”, “fastio”.

3) Discorra sobre a questão migratória (Brasil-Portugal, Portugal-Brasil) a partir do livro de Ruffato.

O personagem tem um amor pela cidade em que ele não está mais (Cataguases) e também o amor pela nova vida em novo país (Portugal), lugar em que ele passa a conhecer aos poucos. O drama está em volta do fator imigratório, tão comum e cada vez mais forte na atualidade.
Serginho se vê numa situação em que passa dificuldades e sofre com o fato de estar em um lugar que é ao mesmo tempo estranho e maravilhoso. Além do fato de estar numa condição em que muitos se encontram atualmente: imigrar para melhorar de vida.
No livro podemos ver duas situações, Serginho que viaja para Europa para melhorar de vida, e seu vizinho que fez o caminho inverso: veio de Portugal para o Brasil e conquistou uma boa vida no país através das duas lojas de panificação.

No decorrer do livro também, vemos o encontro de Sergio com uma brasileira em Portugal, que acaba se tornando sua paixão. Sendo esse também um ponto marcante na construção e evolução do personagem no novo continente, pois se trata de uma relação afetiva de solidariedade que é comumente encontrada entre imigrantes.


Bibliografia: RUFFATO, Luiz. Estive em Lisboa e lembrei de você. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
Referência: <https://www.youtube.com/watch?v=73I60YLYO3M> e <https://www.youtube.com/watch?v=yXn-Jaz1zSE>.

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